Não sei se por estar sozinho, ainda sem a companhia da Catarina, que só mais tarde iria juntar-se a esta viagem, mas o certo é que decidi começar o segundo projecto Rotas Migratórias, desta vez no Sudoeste Asiático, com uma experiência muito diferente do que habitualmente se faz em viagem e que eu jamais fizera: uma inacreditável viagem ao centro do meu próprio universo, traduzida em 14 dias de meditação, umas vezes longos, outras vezes demasiado curtos. Falo de uma viagem ao interior do meu ser, onde o templo de Wat Doi Suthep, localizado na província de Chiang Mai, na Tailândia, teve um papel determinante.

Localizado na montanha que lhe dá o nome – Suthep –, o templo foi construído como mosteiro budista em 1383 e mantém o culto até aos dias de hoje. Rico em estátuas, murais e vários oratórios, o complexo monástico resulta num conjunto arquitectónico de rara beleza que nos faz viajar através dos tempos.

Com uma envolvente repleta de vegetação luxuriante, onde pássaros cantam incansavelmente, mosquitos e abelhas que dançam descontroladamente ou borboletas que voam em insólitas trajectórias, tudo parecia encaixar na perfeição para que fossem duas semanas intensas de meditação no meio da floresta.

Depois de decidir embarcar nesta experiência sabia da necessidade em cumprir um conjunto de regras, impostas a todos os que se juntam aos monges de Wat Doi Suthep, que em qualquer dos casos acabaram por se mostrar fáceis de acatar. São elas:

  1. não matar;
  2. não roubar;
  3. não ter relações sexuais;
  4. não consumir álcool, tabaco ou drogas;
  5. não mentir ou maltratar o outro;
  6. não comer fora de horas – pequeno almoço é servido às 7h e o almoço às 11h;
  7. não cantar, embelezar-se, dançar ou entreter-me com jogos;
  8. não dormir em sitio luxuoso ou de aparente opulência.

Mas não seriam as únicas. Quando cheguei deram-me mais duas que viriam a ser quebradas: não falar e não ler.

criança tailandesa a brincar com sinos de Wat Doi Suthep
Os sinos de Wat Doi Suthep fazem as delicias das crianças.
monges budistas em meditação no templo Doi Suthep
Momentos dedicados em exclusivo à meditação.

Durante os 14 dias que privei com os monges de Wat Doi Suthep aprendi a meditar, a não pensar – muito difícil –, a melhorar a concentração, a estar mais atendo ao que me rodeia e a trabalhar os sentidos do corpo. Em suma, tudo ferramentas importantes para lidar com maus e bons sentimentos ou energias, com particular destaque para os maus, pois se já abundam no interior do nosso ser, há rapidamente que torna-los em coisas boas.

Aprendi ainda a identificar e evitar a fonte do sofrimento; como excluir o ego, mantendo simultaneamente a ideia de que sou o centro do universo – estranho não é !?; ser verdadeiramente livre, saber utilizar a selectividade e receber o conhecimento com a calma que ele merece; olhar para o verdadeiro EU como se da mãe natureza se tratasse; não perder facilmente a razão, despir o pesado fato de actor e observar o que realmente interessa; e, finalmente, purificar o corpo e a mente, sempre com um pensamento mais no presente e menos no futuro ou passado.

Mas isto do aprender, embora seja importante, não chega. Há que melhorar com muita prática e experiência. Um dos ensinamentos que aprendi passa pela seguinte ideia: “Se nos for dada a semente de uma laranja e a semearmos durante a manhã, a árvore não vai crescer a tempo de colhermos o fruto durante a tarde; precisamente o fruto que nos daria outra semente para semear uma nova árvore”. Em suma, tudo demora o seu tempo. E sendo esta uma ideia simples, é o que se aplica na perfeição à essência do nosso ser, pois é nele que devemos focar-nos em primeiríssimo lugar. Simplificando: se a primeira coisa que fazemos quando acordamos é olhar para a envolvente do nosso quarto, e não para o outro lado da janela, é também para o nosso interior que devemos olhar em primeiro lugar, pois só assim poderemos ambicionar ter uma vida melhor e desenvolver ligações fortes com os que nos rodeiam.

macro de uma borboleta
As borboletas fazem de Wat Doi Suthep um lugar ainda mais encantado.

Para os que não queiram apenas ficar por esta leitura, e para começar, sugiro que dediquem tempo à respiração, nem que seja apenas 5 minutos por dia. Acreditem que apesar de estarmos a falar de um princípio básico da vida, vale bem os 5 minutos que lhe possamos dispensar. Concentrem-se em cada inspiração e expiração, sem pensarem em absolutamente mais nada. Vão ver que ao fim de alguns exercícios o resultado vai surpreender-vos.

Dito isto, há que reconhecer que é sempre muito difícil explicar partes de uma viagem que não pode revelar-se através de fotos, ou de textos por muito elaborados que sejam. É por isso que passarei a publicar um par de pensamentos para reflexão, sempre que o tempo e o espirito o permitam. Será uma forma de transmitir aquilo que me foi ensinado e inspirar para a mudança interior de quem achar que a deve fazer. E não se esqueçam… para melhor muda-se sempre!