Em 2005, enquanto grassava mais uma grande epidemia de cólera na Guiné-Bissau, mantive durante 3 meses uma acção de voluntariado com os Médicos do Mundo. A Guiné era até então um país desconhecido para mim. Claro que conhecia aquilo que nos vai chegando através dos meios de comunicação social, mas nunca, nunca poderia estar preparada para o que fui encontrar…

O nosso trabalho consistia em ir de tabanca em tabanca sensibilizando a população com as medidas a tomar para evitar a cólera e ao mesmo tempo encontrar os doentes, pois estes muitas vezes não procuram ajuda, tentando com medidas de desinfecção evitar o contágio aos outros habitantes. Muitos dos doentes eram levados para Centros de Reidratação coordenados pelos Médicos do Mundo, num trabalho maioritariamente feito pela população local (enfermeiros, auxiliares e jovens voluntários) onde nós apenas entravamos com os meios, carros, medicação e informação. A solidariedade foi enorme.

As condições em que fui provavelmente não ajudarão muito o leitor que tenha a intenção de ir de mochila às costas à aventura, visto que fui numa situação privilegiada para a casa que a ONG tinha alugado e com um horário que, embora apertado, me permitia conviver permanentemente com o melhor que a Guiné-Bissau tem para oferecer, as pessoas e a natureza. De qualquer maneira deixo as minhas impressões de um país que me encantou e apaixonou desde o primeiro momento, o primeiro bafo quente e húmido na minha pele.

Não se pode dizer que a Guiné seja um país turístico, embora existam alguns hotéis e restaurantes – penso que se poderão contar pelos dedos das mãos – que procuram captar a atenção daqueles que se aventuram por terras tão pouco ocidentalizadas, mas ao mesmo tempo tão genuínas e autênticas. Uma visita a este país de história comum é sem sobra de dúvida uma aventura extraordinária e uma experiência cultural riquíssima.

Embora estejamos a falar de um dos países mais pobres do mundo, com variadíssimos e graves problemas transversais à sua sociedade, a Guiné é terra de gente boa e genuína. Um lugar onde apesar de já não termos muito em comum, se pode aprender imenso.

Apesar de Bissau necessitar urgentemente de um imenso trabalho, não só ao nível das infra-estruturas – estradas, energia eléctrica, redes de águas e esgotos – mas também do ponto de vista social, nunca senti qualquer tipo de problema ou insegurança na capital guineense. Nas pequenas cidades e tabancas, os mesmos problemas existem mas parecem ter menos impacto na vida das pessoas e a segurança continua a não ser, de todo, um problema.

Com cerca de 30 etnias diferentes, o povo mantém muitas tradições ancestrais e uma convivência que me pareceu muito pacífica e salutar. Apesar das diferenças, os muçulmanos, cristãos e animistas partilham dificuldades e alegrias numa natureza que parece intocável, absolutamente ecológica e onde o tempo parece ter parado. Recordo a imagem da terra vermelha, pincelada pelo verde das árvores de caju, as plantações de arroz e os sagrados poilões.

Uma das melhores formas de conhecer o país, será seguramente na companhia de um guineense originário de uma tabanca. Alguém desprendido de interesses turísticos e cheio de vontade em mostrar um pouco do seu mundo, da sua dimensão, do seu microcosmos…

A minha experiência na Guiné não foi só uma viagem. Foi uma descoberta interior, uma montanha russa de emoções e a possibilidade em me confrontar com uma realidade muito diferente da que habitualmente nos é cómoda aceitar. Hoje é fácil perceber como a realidade é afinal relativa!

Uma viagem à Guiné-Bissau é sem sombra de dúvida uma experiência que vale a pena! Não acredito que alguém lhe possa ficar indiferente e que o somatório de partida mais chegada não seja um enorme sinal mais.

Para quem esteja interessado em visitar a Guiné-Bissau de a mochila às costas, recomendo o guia África, da Lonely Planet. O capítulo dedicado ao país é muito fiel à realidade e bastante prático.