Alappuzha situa-se no Estado de Kerala, que é conhecido pelo epíteto de “God’s Own Country”. Se podemos questionar o porquê deste nome, ao entrarmos em Kerala as dúvidas ficam esclarecidas com as paisagens que nos surgem à laia de presente de boas vindas, com papel de embrulho de várias cores e feitios. Mar, montanha e os famosos remansos competem para ver quem atrai mais turistas. Alguns deles, rendidos, querem o melhor de tudo e optam por visitar cada um destes anfitriões tão tentadores.

Já tinha decidido que iria viajar durante a maioria das minhas duas semanas e meia de férias. Aproveitei o facto de ter um amigo a visitar-me e partimos por quase duas semanas. Depois de visitarmos outros locais, entrámos em Kerala via Coimbatore (Tamil Nadu), num autocarro público. Passámos dois dias em Fort Kochi e aproveitámos a scooter que tínhamos alugado para fazer o percurso de 60 a 65 km até Alappuzha. Estou a falar de duas pessoas e a bagagem numa scooter, durante cerca de duas horas, por uma estrada que precisava de ser melhorada, com vários buracos e cheia de trânsito, mas a viagem fez-se sem nenhum percalço.

Ao chegarmos a Alappuzha, um jovem abordou-nos na rua e perguntou se precisávamos de um sítio para ficar. Fomos com ele até à casa de hóspedes Indraprastham Lake Smart Cruise, onde alugámos um quarto limpo e suficientemente espaçoso, com casa de banho, por 350 rupias (menos de 5 euros).

Depois de nos terem tentado impingir um peixe que não valia as 200 rupias num restaurante perto da casa de hóspedes, sentimo-nos tratados como otários e optámos por sair daquele restaurante, comprar comida e levá-la connosco. Foi um almoço vegetariano, mas apenas a fome nos levou a conseguir comer alguma coisa, já que o cozinheiro não se deve ter esforçado muito naquela tarde. Queríamos uma refeição melhor para a noite e o jovem da recepção aconselhou-nos o restaurante Thaff, alegando ser o melhor da zona. Realmente, ao jantar deliciámo-nos com o peixe guisado que escolhemos e com uma “Kerala parotta” (um dos vários tipos de pães indianos).

Vários backwaters nos remansos de Alappuzha, no estado indiano de Kerala.
Backwaters

Queríamos fazer o percurso de canoa pelos vários canais que passam pelas aldeias. O recepcionista organizou tudo e, no dia seguinte, partimos no ferry logo de manhã até à aldeia do nosso “capitão”. Pagámos 1000 rupias por pessoa e isto incluiu as duas viagens de ida e volta no ferry, o pequeno-almoço, o almoço e a canoa.

O condutor da canoa também estava no ferry, assim como o casal alemão com quem iríamos partilhar a viagem (canoa de quatro lugares). Antes disso, juntou-se a nós um casal indiano para o pequeno-almoço servido em casa do “capitão”. O vizinho dele veio ter connosco pois seria ele a conduzir a canoa.

A comida estava muito saborosa. Eu que normalmente só como “iddlis” (uma espécie de bolos de farinha de arroz cozidos a vapor) quando não tenho outra opção, naquela manhã acabei por comer cinco, já que a esposa do nosso anfitrião fê-los particularmente bem. Os “iddlis” são normalmente acompanhados com “sambar” (guisado de legumes), “chutney” de coco (molho) ou outros tipos de molhos. A senhora serviu-os com “sambar” e com um molho feito com uma variedade de feijões que nos deixou com vontade de comer mais. O pequeno-almoço terminou com um típico chá de especiarias, o chamado “chai”.

Homem indiano, vestido com um lungi, à entrada da sua casa em Alappuzha.
À entrada de casa com o nosso anfitrião.

O condutor mudou de roupa (o “lungi” branco – pano usado à volta da cintura que pode cobrir as pernas por completo ou ser usado dobrado como na foto acima – foi substituído por um de cor coral com uma camisa a condizer) e seguimos todos até às canoas onde nos separámos. Instalámo-nos nas respectivas canoas e preparámo-nos para o passeio pelos famosos “backwaters” (remansos). São vários canais que ligam águas provenientes de diferentes lagos e, nalgumas zonas, também de rios. A palavra remanso adquire aqui um duplo sentido, não apenas por caracterizar as águas estagnadas, mas também pela tranquilidade que se sente ao percorrer os canais, como se tivéssemos parado no tempo. Tirando alguma conversa esporádica na canoa, a natureza foi quem mais se fez ouvir naquela manhã, através do som dos pássaros ou do som da água ao ser penetrada pelos remos.

Em Alappuzha, grande parte das deslocações de pessoas são feitas nos ferries ou em canoas. Por exemplo, existem algumas embarcações que transportam apenas crianças no percurso casa-escola-casa. Outras crianças vão nos vários ferries que transportam a generalidade das pessoas.

Os turistas normalmente percorrem os canais nas canoas a remo ou nos chamados “houseboats” (“casas-barco”). Quem faz o percurso nestes últimos passa pelo menos uma noite no barco, equipado com um ou mais quartos, casa de banho, cozinha, e uma área para relaxar. Trata-se de uma opção bastante cara relativamente às canoas.

Vários barcos a transportar pessoas por entre vegetação serrada nos remansos de Alappuzha.
“Hora de ponta” nos remansos.
Barco para transporte de crianças das escolas de Alappuzha.
Regresso a casa depois de um dia de escola.

Ao longo do nosso passeio, cruzámo-nos com algumas pessoas noutras embarcações. Algumas eram turistas, outras eram pessoas a trabalhar, tais como vendedores de peixe, de garrafões de água de 20 litros ou de bilhas de gás, que se anunciavam através de um som específico feito com a boca.

Alguns dos turistas decidiram experimentar os remos. Um dos turistas franceses quis mergulhar e nadar um pouco. Não precisámos de lhe perguntar como se estava a sentir porque, assim que entrou na água e deu as primeiras braçadas, o comentário dele foi: “Delicious, delicious!”. Considerando a temperatura que fazia, a água devia estar bastante agradável e temperada no grau certo para refrescar o corpo. O nosso condutor perguntou-nos se não queríamos nadar mas nenhum de nós os quatro se mostrou interessado. Eu teria ido caso fosse melhor nadadora do que sou. O jovem alemão disse que não entrava em águas opacas. Assim, continuámos o passeio lançando um último olhar à expressão facial de contentamento do turista francês. Depois de mergulhar naquela água, deve ter ficado com mais energia para continuar a remar até à hora do almoço.

Parámos duas vezes durante o percurso. A primeira para quem quisesse comprar água e a segunda para quem quisesse beber água de coco ou tomar um chá. Sendo uma manhã quente, a maioria de nós optou pela água de coco. O meu era doce e, quando o vendedor o partiu para comer o interior, pude saborear um dos melhores cocos que já comi.

Barco com vendedor de gás em garrafa nos remansos de Alappuzha.
Vendedor de gás.

Alappuzha é ideal para fazer uma pausa e relaxar. Simplesmente estar presente e desfrutar da natureza sem pensar em nada a não ser em apreciar cada imagem e cada som, todos provenientes de um ambiente onde o stress não existe. Ao deslizarmos pelos remansos sentimo-nos como que transportados para um mundo à parte, onde a poluição e o barulho das buzinas, tão característicos nas cidades indianas, são inexistentes. Passar pelos canais onde existem casas à beira da água e poder observar gente a tomar banho ou simplesmente a nadar, e mulheres a lavar a louça ou a roupa, demonstra como naquela zona a natureza e os seres humanos interagem numa dança lenta quotidiana que vai passando de pais para filhos.

Para além das palmeiras e de outra flora, podemos observar vários arrozais. No Sul da Índia consome-se muito arroz e Alappuzha, com a quantidade de água que possui, é ideal para o cultivar.

Por volta das 14h parámos para almoçar. Fomos presenteados com um manjar que incluiu peixe frito pescado nos remansos, arroz branco e  vários legumes – beterraba, couve e pickles de manga. Tudo servido numa folha de palmeira. Quatro dos nossos cinco sentidos foram postos à prova. Inicialmente, o nosso olfacto permitiu-nos detectar os vários odores dos alimentos, enquanto a nossa visão dançava de contentamento com a diversidade de cores sobre a folha da palmeira, tal como de uma paleta se tratasse – o roxo da beterraba, o laranja dos pickles de manga, o branco do arroz, o verde das couves, o amarelo de algumas leguminosas e o dourado do peixe frito. Ao comermos com a mão direita (a esquerda é considerada impura – não deve tocar a comida durante as refeições – por ser usada para outro tipo de funções relacionadas com a higiene), o nosso tacto permitiu-nos sentir as diferentes texturas dos vários tipos de alimentos antes de os levarmos ao destino final e deixar o nosso paladar saborear cada um deles lentamente. De seguida, sentámo-nos no quintal e o nosso anfitrião trouxe-nos um chá preto. Passado algum tempo, acompanhou-nos até ao local onde iríamos apanhar o ferry. Assim terminou o nosso passeio.

Grandes arrozais junto a um braço de água dos remansos de Alappuzha, onde estão dois barcos de transporte.
Grandes arrozais junto aos remansos.
Estrada com pessoas a deslocarem-se para o ferry em Alappuzha, Índia.
Caminho para o ferry no regresso.

No regresso, aproveitámos para beber um café perto da nossa casa de hóspedes, no pequeno café Indian Coffe House. O sabor do expresso lembrou-me alguns dos cafés que costumava tomar em Portugal.

O jantar foi novamente no Thaff. Em Kerala, sendo uma zona costeira, optámos sempre que possível por peixe ou marisco, e mais uma vez apreciámos um saboroso peixe com “parotta” e um lassi (bebida feita à base de iogurte, água e especiarias) doce.

No dia seguinte, muito relaxados e cheios de energia para a próxima etapa da viagem, deixámos Alappuzha e regressámos a Fort Kochi para entregar a scooter alugada.

Quando ir
A melhor altura para visitar Alappuzha é no período que vai de Novembro a Fevereiro.
Como ir
A forma mais fácil e económica de chegar à Índia é através de um voo com destino a Delhi ou Mumbai. Oferta é extensa, pelo que existem várias companhias pelas quais poderá optar. Como não existem voos directos desde Portugal, fará escala numa cidade europeia ou do Médio Oriente, dependendo da companhia que escolha para viajar. Pode encontrar várias opções através de agências online como a eDreamsNetviagens ou Logitravel. Depois, já em Delhi ou Mumbai, pode apanhar um voo interno até ao aeroporto de Kochi ou Thiruvananthapuram, um comboio ou autocarro. Se optar pelo autocarro, poderá ter de fazer escalas adicionais, já que dificilmente encontrará ligações directas a Alappuzha, sobretudo desde Delhi. Para o percurso Kochi – Alappuzha utilize preferencialmente um autocarro e Thiruvananthapuram – Alappuzha o comboio.
Onde ficar
Deixamos aqui uma lista de alguns hotéis e casas de hóspedes em Alappuzha: Indraprastham Lake Smart Cruise, Palmy Residency, Vedanta Wake Up (valor baixo); Gowri Residence, Palmgrove Lake Resort (valor médio); Deshadan Backwater Resort, Vasundhara Sarovar Premiere, Raheem Residency (valor elevado). Pode comparar os preços e ver os comentários de hóspedes anteriores no site Booking.com ou TripAdvisor
Onde comer
A oferta de restaurantes não é muita, mas aqui ficam algumas sugestões: Thaff, Kream Korner, Harbour Restaurant, Chakara Restaurant (situa-se no hotel Raheem Residency e é considerado pelo Lonely Planet como o melhor restaurante na área). Para tomar um expresso, pode ir ao Indian Coffee House, um pequeno café com esplanada.
Seguro de Viagem
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Mapa da cidade