Voltando ao dia-a-dia da comunidade temos ainda de explicar que o hábito alimentar diário passa essencialmente por duas grandes refeições:uma a meio da manhã que, como já referimos, serve de pequeno-almoço e almoço, e outra a meio da tarde, que à semelhança da anterior funciona como complemento do almoço / jantar. Mas não se pense que esta organização tem a ver com carência financeira. Não, nada isso. A explicação é muito simples: como não há electricidade, há uma clara necessidade em ajustar o período em que se fazem as refeições com a luz solar. Além disso, como em certos períodos do ano existem quantidades indescritíveis de insectos, há também necessidade em que as pessoas se deitem mais cedo para se protegerem sob as redes mosquiteiras.

Liana que produz água oftálmica
Liana amazónica que produz água oftálmica

A pior parte que resulta destas maravilhosas experiências é mesmo o tempo que passa a correr. Os dias sucedem-se com uma rapidez difícil de acreditar, mas os que passamos junto à família da Mama Pasquita foram extremamente positivos e gratificantes.

Estava, contudo, na hora de deixar o “pueblo Chino”. Depois de feitas as despedidas, seguirmos em direcção ao Brasil. Queríamos ir até Manaus. Mas como não há barcos nem voos directos, tivemos de atravessar a fronteira Peru – Colômbia – Brasil. Bem complicado… Aqui ninguém sorri e não há grandes conversas. Todos têm um ar suspeito e um olhar frio. Mas há um motivo. Trata-se da fronteira entre os dois maiores produtores mundiais de cocaína (Peru e Colômbia) e um país com uma das mais altas taxas de criminalidade do mundo (Brasil). É na realidade um cocktail que tem tudo para não dar certo. Fomos avisados para termos cuidado e não sair à noite. Infelizmente, e por motivos de força maior (falta de condições de alojamento), eu tive de sair para procurar outro hotel enquanto a Catarina permaneceu no primeiro. Mal entro numa residencial que me pareceu bem, peço para ver o quarto e a luz foi abaixo. Passados uns 10 segundos ouvem-se quatro tiros bem perto. Mais 10 segundos e a luz torna a acender. Mal sai do edifício estava uma pessoa deitada no chão, já rodeada por cerca de 50 curiosos. Ainda a vi tremer e a deixar este mundo. Um pouco traumatizado continuei até o hotel onde estava inicialmente instalado. Optamos por ficar no hotel imediatamente ao lado, que embora fosse caro era seguro. E por ali tivemos que permanecer dois dias à espera que o barco partisse para Manaus. Ficamos quase sempre no seu interior, mesmo durante o dia. Nós só queríamos era sair dali para fora. Chegado o dia, partimos alegremente para a nossa última viagem de barco no Amazonas, pois de Manaus seguiríamos para o Rio de Janeiro num voos que já havíamos reservado.

O Carnaval esperava por nós! Mas antes havia ainda que desfrutar da cidade de Manaus e queimar os últimos cartuxos da Amazónia.