Para os viajantes com grande dificuldade em dissociar o prazer da viagem e a paixão pela fotografia, hoje é um dia triste, portador de alguns momentos nostálgicos e de um grande “amargo de boca”. A Eastman Kodak, empresa que mudou profundamente a história da fotografia, acaba de pedir a falência e protecção contra os credores, após 131 anos de existência.

Fundada em 1880 por George Eastman, a histórica empresa conseguiu manter durante várias décadas uma posição inovadora e vanguardista no mercado da imagem: cabe-lhe a ela a massificação da fotografia como a conhecemos e a sua transformação enquanto passatempo popular.

Um dos momentos verdadeiramente curiosos na história da Kodak, tem ver com o facto de ter sido a empresa a inventar o princípio e a base de funcionamento dos sensores digitais, que hoje são o principal núcleo das câmaras fotográficas e dos modernos smartphones. Mas mais curioso ainda, é o facto de a empresa não ter conseguido fazer a transição e adaptação do negócio que inventou, e, que o mercado exigiu ao longo dos últimos anos. Uma muito rápida transição para o segmento digital, além de sempre ter merecido algum descrédito, sempre foi vista como uma estratégia que poderia comprometer a venda de filmes, papel e química de impressão – a área que historicamente sempre suportou o negócio da empresa. Este terá sido, aliás, um dos grandes erros estratégicos e o princípio do declínio do colosso da imagem americano.

Já em 2009, com o anúncio da suspensão de venda dos filmes Kodachrome – a mítica película dispositiva acarinhada por fotógrafos como Steve McCurry ou Peter Guttman –, após mais de 74 anos de produção contínua, veio relevar algumas fragilidades e demonstrar algum desnorte no caminho a seguir pela companhia.

Agora é a vez da incerteza total. Embora ainda não se conheçam detalhadamente quais os próximos passos da empresa, sabe-se que protecção contra credores e um empréstimo no valor de 950 milhões de dólares, a conceder pelo Citigroup, mas ainda sem a aprovação obrigatória de um administrador de falência, vão contribuir para Kodak tentar reorganizar as suas finanças e adaptar-se às novas exigências do mercado. No momento em que nunca se falou tanto de crise, mercados, ratings e notações, não deixa de ser curiosa a recente reclassificação da divida da Kodak como “lixo”, operada pela agência de notação Moody’s.

Seguindo em frente com o processo de recuperação, a empresa norte-americana pretende ainda alienar parte ou mesmo a totalidade das 1.100 patentes que detém, objectivo que embora já tivesse anteriormente sido anunciado, nunca prosseguiu devido às pressões financeiras e dificuldade em encontrar potenciais compradores.

Só os próximos tempos dirão se o eternizado “momento Kodak” vai ter de ser arquivado junto das películas e fotografias do nosso imaginário. Mas mais do que história, ficará o legado: a empresa fundada por George Eastman contribuiu, mais do que qualquer outra, não tanto para fazer a sua história, mas sim para registar a história dos outros.