PCom crises globais, políticas incompreensíveis, troikas, guerras e desgraças várias, o ainda jovem século XXI, tem sido parco em agradáveis surpresas para a humanidade. Olhando à realidade dos factos, achas que o mundo tem sido ignorante em não se perceber a ele próprio?

RSobre isto, só me posso remeter a um único estado: ao silêncio. Falar em troikas, guerras e todas as outras questões, que neste momento afectam Portugal e o Mundo, é uma enorme perca de tempo. O que é preciso é que todos se preocupem em dar e fazer melhor porque, se assim for, seguramente que as coisas estarão diferentes daqui por uns tempos. Há que não esquecer que o planeta é construído por nós. E a felicidade, onde fica? Já que não se pode comprar na loja, é preciso vivê-la. Temos que nos preocupar em ser felizes e esquecer esta tristeza de proporções globais. Do meu lado, eu estou a fazer a minha parte. E vocês, já fizeram a vossa?

PFalando agora um pouco de outro dos lados da tua actividade, como está a correr a tua experiência televisiva? É algo que gostavas de aprofundar?

RNão só estou a gostar, como acho que vou continuar a fazer este tipo de coisas. Para já estou a gravar uma série chamada “Revelações”, composta por 200 programas de 7 minutos cada, actualmente em exibição na RTP Memória. No fundo, trata-se de um formato onde procuro dar a conhecer 200 países; 200 fotografias; 200 histórias. É um programa que gostaria de ver em outros canais, não porque esteja preocupado com audiências, mas porque seria a forma de fazer chegar o mundo a mais pessoas. De qualquer forma, penso que está tudo a correr muito bem, até porque nunca recebi uma crítica negativa sobre o que quer que seja.

PSe te dessem oportunidade de fazer um programa televisivo exclusivamente de tua autoria, onde o tempo não estivesse tão condicionado, que tipo de conteúdos gostarias de produzir?

REu tenho vários projectos que já foram apresentados a várias entidades, nomeadamente à RTP. De qualquer modo, continuo a sublinhar que qualquer programa que venha a fazer, terá forçosamente que ver com fotografia ou viagens. Eu defendo que as pessoas só devem desenvolver projectos sobre as áreas que dominam, porque quando assim não é, só andam a armar-se em espertos. Aliás, não é por acaso que muito raramente falo sobre aquilo que não conheço.

POutra das vertentes, porventura até menos conhecida das pessoas, é o teu envolvimento na formação. Será que o facto de transmitires os teus conhecimentos técnicos e humanos, pode de alguma forma perpetuar o Nuno Lobito enquanto fotógrafo e viajante?

RSim, em parte é verdade. Eu aposto muito na formação, até porque é uma das áreas onde acredito existirem algumas lacunas em Portugal e no Mundo. Nas minhas formações, além da óbvia componente técnica, aquilo que me parece mais importante é a transferência do conhecimento humano. Não me querendo repetir, é o mostrar quem somos, o que queremos, o saber onde estão os nossos limites e o saber conhecermo-nos a nós mesmos… Há que ter noção que a vida não é mais que uma passagem, portanto, vamo-nos é ajudar e mostrar compaixão uns pelos outros. Eu estou sempre do lado dos meus alunos e dou sempre tudo o que esteja ao meu alcance; estou sempre pronto a ajudar e colaborar. Qual é o resultado disto tudo!? É, por exemplo, a avaliação de 93,8 (numa escala de 0 a 100) que os meus alunos da Restart me atribuíram este ano. Isto é um imenso orgulho e sinal de missão cumprida. Eu posso não ser o melhor, mas garantidamente que dou sempre o meu melhor.

PAlém da componente técnica óbvia, qual é a principal mensagem que procuras passar aos teus alunos?

RProcuro passar uma mensagem muito simples: olhem para o meu exemplo, porque se eu consegui vocês também vão conseguir. Depois há também um trabalho no sentido de os preparar para os muitos NÃOS que vão receber, pois é preciso estar preparado para aguentar um NÃO e os comentários do tipo: “este trabalho não presta… Não vale a pena continuar. Muda é de profissão!”. A isto é que é preciso responder com um redondo NÃO, mantendo-nos fiéis e fortes nas nossas convicções. É por esta falta de preparação que muitas vezes começam 100 para depois acabarem uns 3 ou 4. Mas, mais uma vez, vale a pena seguir o caminho. Eu tenho por aí uma série de bons alunos: fotógrafos fortes que estão no Público, Diário de Notícias e Correio da Manhã. É gente que tem o meu cunho e alma, e que a seu tempo vai dar que falar. Todos eles sabem que podem contar comigo para ajudar naquilo em que eu puder.

PNão havendo agora uma “perseguição” tão obstinada por visitares novos países, a formação é uma área onde te vês mais empenhado e envolvido?

RAcredito que sim. Os 16 anos que já levo com formador, em escolas tão diferentes como o ETIC, Espaço Oásis, Restart ou IPF, permitem-me antever boas oportunidades. Curiosamente um dos locais onde gostava de dar aulas e ainda não o fiz, é na escola onde fui formado – o ARCO. Olha! É uma das coisas onde tenho que me empenhar para poder concretizar em breve (risos).

PSendo tu uma pessoa onde os projectos e ideias aparecem quase em catadupa, achas que a vida vai ser suficientemente longa para conseguires colocar tudo em prática?

RNão aparecem, constroem-se! Os projectos têm de ser construídos sob uma matriz de coerência e solidez. Muitas das vezes os projectos surgem de objectivos que no fundo são as etapas do meu dia-a-dia. Eu não concebo uma vida sem objectivos, porque senão acho que o melhor é mandar-me da ponte. Eu sou daquele tipo de indivíduos que quer trabalhar até aos 100 anos, porque eu adoro produzir, partilhar, dar palestras e formar alunos. É frequente eu estar na cama, já deitado, e levantar-me para me sentar em frente ao computador e escrever um bocado sobre qualquer ideia que surgiu na minha cabeça. Portanto, há realmente um grande número de projectos, mas são sempre feitos e desenvolvidos por mim.

PEnquanto viajante, há algum segredo que nunca tenhas revelado e que o possas fazer neste momento?

RVou só avançar com a seguinte ideia: na vida, já alcancei aquilo que as pessoas queiram imaginar como “cem”, mas também já resvalei sobre o “zero”. Ao longo de todos estes anos, cheios de contrariedades, mas também com muitas alegrias, eu já atingi os dois pólos opostos. Agora, cada um que imagine o que quiser. De qualquer forma, acho que posso revelar um pequeno segredo do meu dia-a-dia: estou à espera do meu cigarro electrónico porque, em princípio, vou deixar de fumar muito em breve. Eu não tenho nada contra os fumadores mas, devo reconhecer que após todos estes anos, já é uma coisa que me enoja.